8.4.18

Sem emenda - A liberdade é melhor do que a censura

Por António Barreto 
Perante os evidentes abusos cometidos pelas grandes operadoras de “redes sociais”, eleva-se o clamor: mata, esfola, proíbe, censura, vigia, controla e regula! São estas as palavras-chave que descansam os incautos e os virtuosos, mas acabam por permitir aos operadores continuar a fazer os seus negócios, com mais ou menos exigências, mas negócios apesar de tudo.
A verdade é que estas “redes” correspondem a objectos de sedução e criam necessidades de consumo (artificiais, pois claro, como praticamente todas as necessidades de consumo). Fomentam novos costumes e hábitos. Estabelecem padrões de comportamento. Resultam de uma enorme capacidade de manipulação do mercado e de um formidável talento para inventar necessidades sedutoras e irresistíveis.
Estas “redes” vieram para ficar. Sejam as mais conhecidas (as ditas “sociais”, a começar pelo famigerado Facebook), sejam todas as outras, fechadas, discretas, profissionais ou diletantes. Há comportamentos, hábitos, sistemas de educação e de ciência, circuitos artísticos e de informação e sobretudo negócios que já não dispensam as “redes”.
Estas vivem das decisões individuais de centenas de milhões de pessoas que, no mundo inteiro, aderem e utilizam. Sem essa adesão, não há “redes”. O único controlo que se conhece é o exercido por governos ditatoriais que têm os meios políticos e técnicos para filtrar e censurar como querem e entendem. Também existe o “acompanhamento” feito por empresas e Estados (mesmo democráticos, como se vê agora), que espiam, gravam e observam. É talvez este o sistema prevalecente.
Proibir estas “redes”? Só as ditaduras. Controlar? Ilusão total. No dia seguinte ao estabelecimento de um qualquer procedimento, logo a seguir os operadores de “redes” inventarão outros sistemas e outras “redes”. Vigiar e regular? Fora de questão. Primeiro, porque já se faz e ou as pessoas não sabem, ou sabem e não se importam, ou os Estados e as empresas que o fazem não confessam. Segundo, porque, neste capítulo, o Estado merece tanta confiança quanto os operadores e as empresas.
A solução para este problema, se é que tem solução, é a velha e santa liberdade. Informada, pois claro. Por outras palavras: quem pode deve dar meios para que o cidadão decida. Informar e publicar listas exaustivas dos perigos, das faculdades concedidas, dos dispositivos que não estão explícitos mas que podem funcionar (localização das pessoas, listas de contactos, inventários de preferências, actividades viciosas e virtuosas, etc. …) e dizer o que se deve recear, o que se pode esperar, o que se pode fazer para contrariar, como se pode apagar uma APP, como se pode não descarregar os dispositivos… Publiquem-se as listas dos intrusivos e dos que perseguem os cidadãos. 
Cada um decida por si. Quanto mais informado melhor. O Estado (e já agora jornais, televisões, universidades, associações privadas…) pode elencar os perigos e as soluções, as ameaças e as vacinas. Mas deixem a cada um escolher os seus vícios, os seus defeitos, as suas virtudes, os seus prazeres e a sua curiosidade… E defender a sua privacidade. Ajudem cada um a saber às quantas anda e o que pode fazer…
Há muito a fazer. Pelo Estado, pelos cidadãos, pelas associações, pelas universidades, pelos organismos de defesa dos consumidores… A palavra de ordem é avisar. Informar sobre as consequências e os efeitos, sobre os perigos e as ameaças. Que acontece a quem se inscreve no Facebook? Que se deve fazer para evitar ser perseguido pelo telemóvel, pelo computador e pelas redes? Que APP se deve liquidar para que não saibam com quem se anda, a fazer o quê e aonde? Isso é que ajudaria o consumidor e o cidadão! Isso é que dava meios para escolher melhor, para defender a liberdade e para ajudar à autonomia de cada um.

DN, 8 de Abril de 2018

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3 Comments:

Blogger Ilha da lua said...

Para o bem e para o mal uma realidade dos nossos dias,transversal a letrados e iletrados Os primeiros,mais informados usam as redes com mais precaução Os segundos pela razão inversa,serão mais incautos Por isso concordo inteiramente com a opinião do Prof.António Barreto

8 de abril de 2018 às 17:25  
Blogger José Batista said...

Sim, não há alternativa melhor.

8 de abril de 2018 às 23:15  
Blogger Luís Bastos said...

António Barreto com a sua clarividência e acutilância habituais.
As democracias liberais,tal como as conhecemos,resistirão, num primeiro tempo, mas vão ter que adaptar-se às novas condições geradas pelas poderosas"redes sociais". O principal palco político mora, agora, noutros sítios. Fenómeno semelhante aconteceu com a "velhinha" TV, em 1960,quando protagonizou o célebre debate Nixon/Kennedy determinando a vitória (inesperada)deste último. A partir de então, os mecanismos inerentes à vida nas sociedades democráticas alteraram-se radicalmente. Hoje, vive-se nova transição e esperamos que as liberdades e os direitos não sejam triturados pelo poder das novas máquinas. Para já, o que sabemos
é que detêm os meios necessários para eleger presidentes, o que já é muitíssimo! O futuro e a liberdade estão a passar por aqui.

azoreantorpor.wordpress.com

10 de abril de 2018 às 22:06  

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