22.12.17

FINALMENTE VÃO MATAR O 'COUTINHO'?

Por Joaquim Letria
A namorada do meu filho Miguel nasceu e cresceu em Viana do Castelo. Por isso, ambos passam lá a vida e não imaginam Viana sem o edifício Coutinho porque nunca viram a cidade sem aquele prédio à beira do Lima. Um e outro mostram-se surpreendidos com a data próxima da execução pública do edifício condenado. Não por serem adeptos da sua arquitectura, – mas porque consideram o “Coutinho” um ex-libris da cidade.
Um e outro a rondarem os 30 anos de idade, sabem coisas que a generalidade dos políticos desconhece: a primeira é que é difícil arranjar trabalho; a segunda é que ganhar qualquer coisa que se veja com um trabalho honesto é muito raro; também já descobriram que alguém que não se inscreva numa “JOTA” da situação e não passe a vida a pedir “cartolas” e a vender favores está feito. Ambos consideram que o dinheiro para derrubar o “Coutinho” faz falta em coisas úteis.
Começado na ditadura com 9 mil contos do Sr. Coutinho, um ilustre emigrante no Congo, e agora deitado abaixo por um milhão e setecentos mil euros, o “Coutinho” chegou a ser considerado uma conquista de Abril pela sua construção (1970-1975) anti-sísmica e aguentou-se até o ministro do Ambiente José Sócrates exigir a sua “implosão exemplar”, acolitado pelo Dr. Defensor Moura, presidente da Câmara de Viana e ex-morador do “Coutinho”, médico prestigiado injustamente castigado por assobiar pelos corredores do hospital onde trabalhava.
 Quando o conhecido engenheiro da Cova da Beira chegou a ilustre primeiro-ministro, então o veredicto tornou-se irreversível, com diversos juízes a dizerem “ora sim senhor” e outros a considerarem “ora nem pensar”.
Engraçado como o ”Edifício Jardim” de treze andares se converteu no “Prédio Coutinho”, com licenças legais e integrado no que ao tempo se chamava de ‘modernidade’. É que foi a própria Câmara, para arranjar dinheiro para comprar o palacete que ainda hoje ocupa, quem pediu dinheiro ao Sr. Coutinho, oferecendo-lhe em troca o direito de multiplicar por dois o número de apartamentos, subindo o número de andares por ali acima (inicialmente seria para ter 6 pisos). Ou seja, tudo legal, uma bela “cartola” seguida duma límpida troca de favores, uma operação que hoje seria considerada pelos poderes vigentes como uma “hábil e mutuamente vantajosa proposta política”.
A escrever para ser maioritariamente lido por gente do Alto Minho, não cometo a indelicadeza de maçar os leitores com aquilo que a generalidade dos políticos considera “pormenores irrelevantes”, como seja o que foi feito dos mais de 250 locatários que fugiram do “Coutinho”, uns cansados de um conflito que se adivinhava longo e de pagar a advogados, vendendo ao desbarato os seus andares, outros aceitando permutas por casas hoje mais degradadas que o gigante a abater, mesmo entre aquelas de que a Vianapolis se serviu para povoar a aplanada zona das ribeiras.
O Sr. Coutinho morreu há uns 8 anos, com mais de 90 anos, deixando o seu gigante (do qual chegou a ter 58 fracções) de pé. Mas o tempo, a idade de cada um, os custos da Justiça, os cursos e recursos de certos juízes, os advogados avençados pela Câmara (Poder local) e pela Vianapolis (Poder central) venceram, como era de esperar, os valorosos e dignos últimos resistentes a quem agora ameaçam expulsar pela força sem mostrarem o menor respeito e humanidade. Os poderes públicos no seu esplendor…
“Padre, perdoa-me pois eu continuo a pecar”, bem poderia dizer a todo o instante o actual presidente da Câmara, a toda a hora companhia do Senhor Bispo de modo a que nem um nem outro sejam assaltados por maus pensamentos ditados pelo injusto esquecimento das graças recebidas em vida do Sr. Coutinho…
Mas se destruir o sonho de quem fez sacrifícios para viver no “Coutinho” não preocupa os políticos, estes podiam ao menos curvar-se perante a dignidade dos cerca de 30 moradores que ainda ali restam, entre os quais se pode adivinhar o espanto contido daquele senhor de 93 anos, com cancro na próstata e algaliado, a quem nem sequer permitem que morra em paz no “seu Coutinho”.
Publicado no Minho Digital

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4 Comments:

Blogger Bmonteiro said...

Acompanhei a saga do Coutinho desde sempre.
Desde que o regime soltou algumas bestas, que estagiando na autarquia e no governo, tudo podem.
Sob a patranha do ambiente e de uma estética a roçar a indigência mental dos novos ricos da política, que de f--- a população residente.
Que de f----os sobreviventes.
Que o Tesouro público é grande, e os «escribas e fariseus hipócritas» (há dias no Evangelho de Pasolini na Cinemateca), os seus profetas.
Nada a fazer, com esta raça, caro Joaquim.
Bm

23 de dezembro de 2017 às 17:46  
Blogger Táxi Pluvioso said...

Venho desejar um BOM NATAL

24 de dezembro de 2017 às 10:50  
Blogger José Batista said...

Muito certeiro, o Joaquim Letria.
Estive nesse prédio mais que uma vez, num dos andares cimeiros, em casa de quem me acolheu, fez em Março 29 anos. Sem achar que o prédio em si fosse algum prodígio de arquitectura ou de enquadramento na cidade, uma vez construído, nunca percebi a teima de o deitar abaixo. É muito mais fácil escangalhar do que construir. Difícil é aceitar o desperdício, num país pelintra e caloteiro. Não espanta que movimento tão zeloso venha do tempo do «engenheiríssimo» da Cova da Beira (eu creio que ele não é de lá...). O que surpreende e dói é que esta idiotice não tenha sido parada e que a tenhamos que somar ao que vamos pagando por causa das acções de políticos incompetentes.
Bom Natal.

24 de dezembro de 2017 às 19:25  
Blogger Bmonteiro said...

Sorry, quanto ao dito engenheiro engenheiro da minha Cova da Beira.
O nosso charlatão-mor, uma cepa doente da Trás-os-Montes.
A cada um a sua geografia.
Bom Ano novo.

25 de dezembro de 2017 às 11:03  

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