6.6.16

CARTA ABERTA AO MINISTRO DA EDUCAÇÃO

Por A. M. Galopim de Carvalho
CARTA ABERTA AO MINISTRO DA EDUCAÇÃO, TIAGO BRANDÃO RODRIGUES, justa e vibrantemente aplaudido, ontem, num momento alto do discurso de António Costa, no encerramento do 21º Congresso de PS.
Embora se perca muitas vezes, só a luta pode alcançar vitória. E é por isso que me habituei a não desistir de lutar.
Assim, uma vez mais, lanço esta CARTA ABERTA AO MINISTRO DA EDUCAÇÃO, a par de mais uma que procuro fazer-lhe chegar às mãos sobre o ensino da Geologia nas nossas escolas Básica e Secundária.
Quem, a nível político, tem decidido sobre o maior ou menor interesse das matérias curriculares referentes à disciplina de Geologia mostrou desconhecer a real importância deste domínio do conhecimento como motor de desenvolvimento e bem-estar, mas também como componente da formação cultural dos portugueses.
Como é público, insisto em afirmar que, no panorama das nossas escolas, e com as sempre necessárias e honrosas excepções, esta disciplina limita-se a um conjunto de matérias desarticuladas e desinseridas de um contexto unificador, tidas por desinteressantes e, até, fastidiosas. São muitos os professores mal habilitados que as debitam sem entusiasmo, por dever de ofício. São muitos os que, sem capacidade crítica, seguem o estereotipado e igualmente acrítico manual adoptado, que o aluno decora por obrigação de um programa de mérito discutível, e que lança no caixote do esquecimento, passado que foi o exame final.
Tem sido este o quadro nas nossas escolas, onde a Geologia sempre foi subalternizada. Foi este o quadro em que cresceram e se formaram a imensa maioria das mulheres e dos homens que hoje temos na política, na administração, nas empresas, na cultura, na comunicação social, no cidadão comum.
É preciso e urgente olhar para esta realidade do nosso ensino. É preciso e urgente que o Ministério da Educação chame a si meia dúzia de professores desta disciplina capazes de proceder à necessária e profunda revisão de tudo o que se relacione com o ensino desta área curricular, a começar nos programas, passando pelos livros e outros manuais adoptados, pela formulação dos questionários nos chamados pontos de exame sem esquecer a necessária e conveniente formação dos respectivos professores.
Sempre disse e insisto em dizer que o professor, deve saber muitíssimo mais do que os alunos a quem se dirige. Não pode, de maneira nenhuma, ser um mero transmissor das noções, tantas vezes, torno a dizer, estereotipadas e acríticas dos manuais de ensino.
Imenso e tido por inabarcável, ao tempo dos descobrimentos marítimos, o nosso Planeta é hoje assustadoramente pequeno face ao crescimento exponencial da população, além de que começa a dar preocupantes sinais de agressão já evidentes na poluição do ar que respiramos, da água que bebemos e dos solos onde, é bom não esquecer, radica a maior parte da cadeia alimentar que nos sustenta. Sendo a geologia uma disciplina científica que nos fornece o essencial dos conhecimentos necessários à defesa do ambiente natural e à protecção da natureza, é fulcral atribuir-lhe, ao nível da Escola, a importância que, realmente, tem.
Da exploração racional dos recursos geológicos, mineiros e energéticos, todos eles não renováveis (e são tantos) e das águas subterrâneas à protecção do ambiente e à prevenção de catástrofes naturais, a geologia faculta-nos os conhecimentos indispensáveis.
Apesar de ínfima no contexto da biodiversidade, esta criatura, a última de uma linhagem evolutiva de milhares de milhões de anos, a que foi dado o nome de Homo sapiens, só por si e desde o advento da Revolução Industrial (finais do século XVIII, começos do XIX), tem vindo a atentar, a ritmo crescente, contra o meio físico que a todos rodeia, atingindo, no presente, níveis alarmantes que justificam, entre outras reuniões internacionais, a COP 21, que teve lugar no passado ano em Paris.
Na sociedade de desenvolvimento, tantas vezes descurando os bem conhecidos preceitos de sustentabilidade, privatizam-se os benefícios da produção e distribui-se pelos cidadãos a subsequente poluição. À desenfreada procura de lucro de uns poucos, tem de opor-se a necessária cultura científica por parte desses mesmos cidadãos. E a Escola tem, forçosamente, que fornecer essa cultura em articulação harmoniosa e inteligente com os saberes de outras disciplinas. Não o “molho” de definições que (salvo honrosas excepções) tem sido a sua praxis.
Sendo certo que a capacidade de intervenção de cada indivíduo, como elemento consciente da Sociedade, está na razão directa das suas convenientes informação e formação científicas, importa, pois, incrementá-las. E incrementá-las é facultar-lhe correctamente o acesso aos conhecimentos que, constantemente, a ciência nos revela.
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Com os respeitosos cumprimentos.
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Lisboa, 5 de Junho de 2016
António Marcos Galopim de Carvalho

(Professor catedrático jubilado da Universidade de Lisboa)

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3 Comments:

Blogger opjj said...

Anestesiado com os aplausos justos,V.Exª um catedrático jubilado consegue mostrar-nos onde e quando o ministro provou alguma coisa, quer na investigação quer em obra feita por cá? Seis meses altamente reprodutivos que equivalem a uma vida!
Fanatismo patético.
Um investigador pago a preço de ouro durante anos cuja obra nada se conhece.
Todos os que coabitam com a manjedoura do Estado só mostram vitupério.
O Brasil tem uma expressão para isso, " Cai na real"
Cumps.

6 de junho de 2016 às 16:08  
Blogger José Batista said...

Um texto incisivo e muito necessário, pela mão do Professor Galopim, e que já fazia falta há muito.
Li, apreciei e (já) reencaminhei para os colegas de grupo disciplinar da minha escola.
Com aplauso (pessoal) do tamanho da minha gratidão, extensivo à acção do ministro da educação no que toca ao corte dos chamados contratos de associação, muito lucrativos para uns quantos, à custa do dinheiro dos contribuintes e da destruição da escola pública.

6 de junho de 2016 às 17:13  
Blogger Ilha da lua said...

Espero que o Ministro da Educação leia e reflita nas sábias palavras desta carta.

6 de junho de 2016 às 23:59  

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