6.3.14

O homem que punha o Presidente no bolso

Por Ferreira Fernandes
O primeiro-ministro Balsemão e o Presidente Eanes desconfiavam tanto um do outro que nas reuniões que tinham a sós traziam, cada um, o seu gravador. Punham os aparelhos em cima da mesa, a falta de confiança era sincera. Uma birra, comparada com o exemplo indecoroso que nos chega de França. Para as presidenciais de 2007, Nicolas Sarkozy recrutou Patrick Buisson, um intelectual, antigo jornalista de extrema-direita. Monárquico e católico, Buisson passou a ser a eminência parda do Eliseu, função que exercia com soberba - fez questão em não ter cargos oficiais, nem gabinete no palácio. Influenciar o "rei" chegava-lhe. Quando foi condecorado com a Legião de Honra, Sarkozy disse: "A ele devo ter sido eleito." Durante o mandato suspeitava-se que ele era o conselheiro decisivo nas políticas e nas remodelações. Suspeitava-se. Hoje, sabe-se. É que a forma altaneira de Patrick Buisson exercer a sua influência era acompanhada por um vício. No bolso do casaco, escondido, levava um gravador. Horas e horas de conversa, a que nem escapava Carla Bruni quando ia buscar o marido às reuniões. Ontem essas gravações deslizaram para os jornais (parece que um conflito familiar fez Buisson perder o controlo do seu material). O que foi publicado chega para provar o abuso, traição até, a que foi sujeito o Presidente. E a França pergunta-se: até que ponto se gravou? A resposta não é moral, é mais simples: gravado, hoje, fica tudo.
«DN» de 6 Mar 14

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