27.10.13

Oh, o anjo loiro afinal era cigano...

Por Ferreira Fernandes
PARECE que Maria, loira e olhos verdes, afinal não é das nossas. É mesmo filha de ciganos, não grega, é certo, como era a família onde ela foi encontrada, mas de ciganos búlgaros, pais tão escuros como os tais gregos mas com uma prole de matizes diversas, incluindo os cabelos dourados e os olhos de mar de Maria. Pronto, ela não é das nossas, concluiu-se com um suspiro, misto de alívio e desesperança. Alívio porque talvez o homem do saco seja um mito, talvez ele não ande por aí a raptar os nossos filhos; desesperança porque, para os pais de filhos desaparecidos, Maria anunciava outros achamentos... 
Chegado aqui, apetece limpar-me desta telenovela barata. Entre os preconceitos profundos (o medo do raptor errante) e o ligeiro politicamente correto (o receio de suspeitas sobre uma etnia) há que dizer do que estamos a falar quando falamos de Maria. Isto: dela, de Maria. Ela é a protagonista desta história, o Norte e o Sul, o céu e a terra. Há mais personagens e todas elas mergulhadas na miséria mas o essencial desta história é a salvação de Maria. Fosse ela negra ou esquimó, comprada e usada, em família sueca, ela era a nossa. Merecedora do que a história europeia diz ter reservado para as crianças: prioridade no respeito. 
Maria não é uma esperança para a Maddie, ela é a Maria. Maria não é refém das misérias da verdadeira mãe que a vendeu e da falsa mãe que a comprou, ela é a Maria. E tendo sido salva é salvação para nós todos.
«DN» de 27 Out 13

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