22.7.13

Não, Sr. Ministro

Por Maria Filomena Mónica
É JULHO: chegou a época dos exames. O Ministro da Educação afirmou esta semana que a «razia» nas classificações não se devia às provas a que os alunos foram sujeitos, mas à sua falta de preparação (Público, 17. 7. 2013). Não, Sr. Ministro, isto não é verdade.
Por a minha neta primogénita ter sido sujeita ao exame do 12.º ano de História A, decidi passar uma vista de olhos pela prova. Além de ideológica, é completamente imbecil. O Grupo I, dedicado às «Transformações na Europa nas primeiras décadas do século XX», tinha dois documentos: um mapa com a Europa após a Primeira Guerra Mundial (onde figuravam os Estados que perderam território, os que os tinham adquirido e ainda os que haviam recuperado a sua independência) e uma reprodução de um quadro, O Vendedor de Fósforos, de Otto Dix, em que aparecia um mendigo sem pernas com uma dezena de caixas de fósforos numa bandeja. Ao aluno, pedia-se-lhe para identificar três – este número deve ser mágico, pois aparece em todas as perguntas – características do modernismo. Solicitava-se-lhe ainda que explicasse, «com base nos documentos 1 e 2», três problemas político-sociais vividos na Europa após a Primeira Guerra Mundial. A minha resposta teria sido: «Nos países que perderam territórios na Primeira Grande Guerra, passaram a existir vendedores de fósforos nas ruas». Que nota me teria dado o professor-classificador?
No Grupo II, «Da agonia do Estado Novo ao Portugal Democrático», apareciam 4 documentos. O prémio do mais aberrante vai para o 2, uma transcrição de extractos do debate televisivo, ocorrido a 6 de Novembro de 1975, entre Mário Soares e Álvaro Cunhal. Gostaria de saber como o examinador classificaria um aluno que tivesse escrito: «Apesar de o PS ser um partido de esquerda, que dizia pretender instaurar uma sociedade sem classes, quem tinha razão era Cunhal, visto que o Partido Comunista tem mostrado o seu apego às liberdades, pelo que podemos afirmar que os comunistas querem um Portugal democrático, enquanto o PS quer um regime de democracia apoiada pelos monopólios.» 
No tema de desenvolvimento, «Portugal: do 25 de Abril de 1974 ao início do século XXI», especificava-se que o aluno deveria integrar, além dos seus conhecimentos (sic), os dados disponíveis nos documentos de 1 a 4. Mais uma vez as respostas se prestam a uma classificação arbitrária. Aparecia um texto de Delors, atingindo aqui o exame as raias da propaganda. Eis a primeira pergunta: «Explique, a partir do documento, três dos factores que justificam a hegemonia dos EUA no final do século XX e início dos século XXI», seguida de: «Refira três das políticas que, segundo o autor [Delors], podem contribuir para ´construir uma Europa que tenha influência no mundo`». Mas que deseja o GAVE? Que os alunos demonstrem a sua capacidade para ter opiniões de café? Com milhares de adolescentes sujeitos a este tipo de provas espanta-me que nenhum pai tenha protestado. A educação dos rebentos deve vir em último lugar na sua lista de prioridades.
«Expresso» de 20 Jul 13

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1 Comments:

Blogger José Batista said...

Não, não é verdade.

As provas de exame de biologia e geologia são também um prodígio de sobranceria, incompetência e imbecilidade.

Sobre elas me tenho pronunciado por escrito sem que os problemas que levanto tenham causado ondas entre os alunos, os seus pais, ou mesmo os professores e, muito menos, nas estruturas do ministério. Vá lá que, este ano, a associação de professores de biologia e geologia, de que não faço parte, já se pronunciou como é devido. Veio tarde mas (sempre) veio.

Agora, entre nós, no ensino, já não vale a pena apontar erros, falhas, omissões e incompetências, porquanto, o que se segue acaba inexoravelmente por ser (ainda) pior do que o que existia.

E assim vamos escorregando pelo plano inclinado. A minha aflição é não conseguir divisar onde esteja o fundo...

22 de julho de 2013 às 12:22  

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