16.5.13

«Dito & Feito»

Por José António Lima
A COMUNICAÇÃO de Paulo Portas ao país, no passado domingo, a propósito dos novos cortes na despesa do Estado, foi um prodígio de encenação política e malabarismo partidário. O líder do CDS presenteou-nos com mais uma originalidade – a de os ministros virem cá para fora relatar as posições que se tomam em Conselho de Ministros – e aproveitou para desancar na inflexibilidade da troika visando, de facto, atingir a insensibilidade de Vítor Gaspar.
Mas o objectivo central desta intervenção de Portas era o de aparecer aos portugueses, e em particular à larga fatia de idosos da base eleitoral do CDS, como o ‘polícia bom’, com preocupações sociais e de soberania nacional, em contraste com os ‘polícias maus’ deste Governo de cortes e austeridade (Passos e Gaspar, claro). Por isso, a propósito da «TSU dos pensionistas», como lhe chamou, o ministro Portas enfatizou: «Num país em que grande parte da pobreza está nos mais velhos, o primeiro-ministro sabe e creio que essa é a fronteira que não posso deixar passar». Muito comovente e conveniente.
Acontece, porém, que enquanto o líder do CDS se mostrava muito indignado com os 436 milhões de euros que o Estado ia retirar em 2014 aos pensionistas da Segurança Social (tendo já o compromisso de Passos de haver margem de recuo desta medida) já não revelava qualquer incómodo com os 740 milhões de euros que o Governo decidiu cortar em 2014 a outros pensionistas, os da Caixa Geral de Aposentações.
Portas diz querer «uma sociedade que não descarte os mais velhos», mas parece haver velhos – os pensionistas públicos da CGA – mais descartáveis que outros, na óptica do CDS. Os cerca de 3 milhões de reformados da Segurança Social, que iriam perder em média 146 euros por ano com a ‘TSU dos pensionistas’, nem pensar! – estão para cá da fronteira delimitada por Portas. Mas os 600 mil aposentados da CGA, que vão ficar em média sem 1.226 euros anuais (oito vezes mais do que a taxa que tanto transtornou Portas), não incomodam o líder do CDS, que acha tal medida «inevitável» e «satisfatória». Mesmo que ela implique «uma espécie de cisma grisalho» dos pensionistas públicos.
Percebe-se que 3 milhões são muitos mais do que 600 mil e que, por ironias eleitorais, uma das pastas de ministros do CDS é precisamente a da Segurança Social. Mas a duplicidade de fronteiras de Portas, para pensionistas públicos e não públicos, roça a demagogia e o descaramento. Vá lá, desta vez não pôs António Pires de Lima a falar por ele.
«SOL» de 10 Mai 13

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