25.4.12

Soares com fogo ao peito

Por Ferreira Fernandes
MÁRIO Soares não vai estar hoje no Parlamento. É atitude errada e é atitude bonita. Esta parece-me a mais importante. Aos 87 anos dizer "sei que não vou por aí" - mesmo, como dizia José Régio dois versos antes, manifestamente estando também no "não sei por onde vou/ não sei para onde vou" - vale mais do que as baratas encolhidas e assustadas em que nos tornamos todos. 
O susto sendo geral, haja um velho, grande e respeitável que diga qualquer coisa, seja até um simples "não". Soares não o diz para fazer prova de vida, não precisa, ele diz porque é daqueles (a história pessoal convenceu-o disso) que sabem que há momentos em que, mesmo sem soluções, o gesto é preferível à modorra e a palavra ao calar. 
Sendo este ano tão triste e cinzento, Mário Soares decidiu não ir às comemorações oficiais e pôr um sinal de fogo ao peito para fazer contraste com o pano de fundo de cravos murchos à lapela. Bonito, disse-o lá atrás, e repito. Mas (e esta adversativa é menor do que o meu aplauso) a atitude de Soares é errada. 
O "não" de Soares, por si só, é fulgurante. O problema é com quem ele não vai por aí... Encostado à Associação 25 de Abril (ele justificou a não ida ao Parlamento por solidariedade com ela), Soares fica misturado com as tolices dos passadores de certificados de democracia em que alguns velhos capitães se tornaram. O que é infeliz porque o contributo maior que Soares nos deu foi ter tornado de todos o 25 de Abril. 
«DN» de 25 Abr 12

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