28.12.08

A mansarda e o jardim

Por Nuno Brederode Santos
AJOUJADOS À SERVIDÃO dos fumadores, os "meus" gerontes reúnem-se, pela manhã, na esplanada do café, porque "lá dentro" não se pode fumar. Albardam-se como os índios da reserva, mas sem direito a fogueira comunal. Falo por mim: camisola interior numa fibra mais severa que amianto, camisola lambswhool, casaco, "cachecol" e gabardina. O vento frio corta a direito, em grandes lençóis horizontais que ignoram as lentes dos óculos e libertam lágrimas indesejadas. A mão só sai da luva para brandir a chávena e, mesmo assim, o corpo treme todo, como se levado ao paredão de um pecado ou crime de que não guardo consciência nem memória. Busco refúgio na ideia de que, na véspera do Natal, haverá por certo um stock de temperança e amor pelo desvalido que me irá proteger das culpas que desconheço. E olho para os três jornais que comprei, perguntando-me quantos anos mais resistirei a trazê-los debaixo da camisola. Os vizinhos deram sumiço, acolhidos aos fogos de família do país interior, de onde só voltarão no domingo, carregados de chouriças e azeite "lá de casa". Só mesmo alguns jovens passam, eles e elas na arrogância das camisolinhas de manga curta, a lembrar-nos o que já tivemos e como nos resta merecer os aconchegos da segurança social.
(...)
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