24.1.08

Menezes contra Menezes

Por Pedro Lomba
CONFESSO QUE ANDO PREOCUPADO com Luís Filipe Menezes. Ele não me parece o mesmo. Os sinais de mudança são ténues mas existentes. Tenho a sensação de que Menezes declarou guerra a si mesmo. Menezes quer ser outro, um anti-Menezes, uma figura irreconhecível. Vamos ser simples. Ao fim de alguns meses, a pergunta a fazer sobre Luís Filipe Menezes é a seguinte: está o líder do PSD a fazer o que prometeu, isto é, a preparar com inteligência e originalidade um caminho para 2009, ou a sua liderança não passa até agora de um acto falhado?
A resposta à primeira pergunta podia encontrar-se nos últimos acontecimentos de agitação conspirativa dentro do PSD. À partida, dir-se-ia que Menezes trazia uma nova legitimidade. Percebia o ânimo e o desânimo do militante social-democrata com quem trocou desejos e confidências sobre o futuro. Mas o PSD continua insatisfeito e a congeminar alternativas em segredo. Isso quer dizer que o PSD deixou de querer Menezes? Não. As divisões feudais do PSD são um facto garantido. Qualquer liderança tem de viver com elas. Mesmo que Menezes agora as censure, ele próprio passou os últimos anos a fazer precisamente o mesmo. Onde está então o problema de Menezes? Quando Santana Lopes chegou a primeiro-ministro, lembro-me do momento em que senti que havia qualquer coisa errada na experiência e não era má vontade minha. Foi quando, no Natal de 2004, Santana resolveu discursar na televisão com um par de óculos curtos na ponta do nariz. Enquanto Santana poetizava sobre os feitos do seu Governo recente, eu olhava para os óculos e instintivamente rejeitava tudo o que ele dizia. Aquele não era o Santana Lopes que eu conhecia. Aquele ser que lia com pausa e profundidade era uma ficção.
Luís Filipe Menezes parece interessado em alimentar agora a construção fictícia da sua personalidade política. Notem que não estou a falar de propostas risíveis como aquela que fez para redistribuir os comentadores televisivos em função das fidelidades partidárias. Mas, só para dar um exemplo, esta semana ouvi Menezes criticar os "discursos oásis" de todos os governos e denunciar, cito, "uma obsessão exclusivamente em torno do défice, que viveu às custas do congelamento dos salários dos funcionários públicos e aumento dos impostos, em vez de o fazer pelo crescimento económico". O que é isto? Eu podia antes perguntar como é que Menezes quer promover esse crescimento económico porque ele não o diz. Sucede que é demasiado óbvio que Menezes não sabe o que dizer como líder da oposição. A sua imagem na política portuguesa é a de um revanchista e peronista em versão Vila Nova de Gaia. Ninguém o reconhece na pele de um conhecedor responsável e sofisticado. Sim, eu tenho saudades de Luís Filipe Menezes.
«DN» de 24 de Janeiro de 2008-c.a.a.

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2 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Pedro Lomba é um dos cronistas convidados do 'Sorumbático', tal como João Miguel Tavares.

Já agora, e sobre o mesmo assunto, aqui fica a 1ª parte da crónica deste último - publicada no «DN» de anteontem:

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OS PECADOS DO PSD E OS MILAGRES DO BCP

1. Os partidos são como os clubes de futebol: passam a vida à espera de milagres. O Benfica há 20 anos que não constrói uma equipa de jeito mas a cada início de época os jornais são inundados por extraordinárias promessas de glória. É provável que isso aconteça? Provável não é. Mas os adeptos adoram acreditar. Quando Luís Filipe Menezes subiu ao cargo mais alto do PSD, os militantes devem ter esperado por um mesmo género de milagre. Que aquele homem mediano, que poucas vezes deu nas vistas e que quando deu foi quase sempre pelas más razões, se transformasse num estadista de relevo. Um político com visão, subitamente revelado pela ascensão ao poder. Mas passados quatro meses, como acontece com os milagres e com o Benfica, a esperança esfumou-se e toda a gente já viu o óbvio. Afinal, Luís Filipe Menezes é apenas Luís Filipe Menezes.

A sua recente intervenção sobre os comentadores televisivos, e a teoria de que eles devem ser repartidos pelos partidos como quem divide chupa-chupas por meia dúzia de crianças gulosas, é deprimente de tão ridícula. Como é possível que aquele homem não tenha percebido que as suas palavras se iriam transformar em motivo de galhofa? Porque uma coisa é cometer uma gaffe. Acontece a todos. Outra coisa, bem diferente, é um discurso estruturado parecer o argumento de uma comédia americana. Isso não acontece a qualquer um. Na verdade, isso só acontece a quem é muito mau.

O espantoso, no entanto, não é que Luís Filipe Menezes seja mau. Isso há muito que muitos tinham percebido, e alguns não se cansaram de denunciar. O espantoso é que o PSD, dois anos e meio depois de Santana, tenha voltado a lançar-se numa aventura suicida, entregando-se nas mãos de um homem que talvez consiga gerir bem quatro assoalhadas mobiladas, mas que ninguém, com dois dedos de testa, consegue imaginar à frente do País.

(...)

24 de janeiro de 2008 às 11:42  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Esclarecimento:

No caso dos cronistas convidados, os seus textos têm, a seguir à indicação da publicação onde saíram, a indicação «c.a.a.», abreviatura de «Com Autorização do Autor».

24 de janeiro de 2008 às 11:45  

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